Nos últimos artigos tenho-me focado muito nas limitações do plantel do Benfica como causa principal dos recentes maus resultados.
Muitos dos comentários aqui deixados e artigos noutros blogs do Benfica têm porém insistido nas responsabilidades de Rui Vitória, sendo (ou parecendo) opinião generalizada que o treinador não tem condições para inverter a situação e deve sair.
Muito embora percebendo todas as críticas e a descrença, penso que não chegámos a esse momento e que Rui Vitória ainda pode dar a volta à situação. Segue-se a minha avaliação, estando os leitores convidados a deixar os seus comentários e opiniões, como sempre aqui acontece.
A solidez mental de Rui Vitória
Fui um grande crítico de Rui Vitória nos seus primeiros tempos de Benfica. Não engoli muito o argumento de que a "estrutura" seria um garante de uma estabilidade e solidez que permitiria ao clube continuar a senda vitoriosa. Achava que Rui Vitória não tinha dimensão para o Benfica. A verdade é que, depois de um início titubeante, no momento da verdade Rui Vitória mostrou grande frieza. Nunca se "desmontou", nunca colapsou perante as críticas, a desconfiança e as provocações e no fim soube pôr o Benfica a jogar um grande futebol e a vencer títulos.
A integração de jovens na equipa
Rui Vitória é o responsável pelo lançamento de vários jovens jogadores na equipa principal: Nélson Semedo, Renato Sanches, Victor Lindelof, Gonçalo Guedes e Éderson. Muitos outros tiveram oportunidades, mas por esta ou aquela razão (ainda) não se impuseram. Acima de tudo fica a ideia de que Vitória não tem qualquer receio em apostar nos jogadores e que estes, sentindo-se apoiados e portanto confiantes, mostram as suas qualidades.
O excelente futebol do Benfica
O Benfica já jogou um excelente futebol desde que Rui Vitória chegou ao clube. Curiosamente dos melhores jogos que fizemos, nomeadamente as duas recepções ao Porto, não vencemos, mas quem não se lembra do completo massacre que fizemos no primeiro jogo ou das defesas impossíveis de Casillas em qualquer um deles? Quem não se lembra da vitória sobre o Atlético em Madrid? Da dinâmica atacante e das goleadas, sobretudo, mas não apenas, em jogos em casa (a última das quais já esta época, contra o Belenenses)?
Os títulos
No futebol, como em todos os desportos de alta competição, os resultados são a ultima ratio da avaliação do trabalho de um líder. E nesse capítulo Rui Vitória já deu provas mais do que cabais: dois campeonatos disputados - dois primeiros lugares, duas Taças - uma vitória, duas Taças da Liga - uma vitória, duas Supertaças - uma vitória, duas Ligas dos Campeões - duas qualificações, uma para os oitavos outra para os quartos de final.
O desastre da presente época
O mais irónico de tudo isto é que a presente época até começou bem. O Benfica ganhou a Supertaça e venceu os primeiros jogos de forma convincente. No entanto a partir do momento em que se teve o primeiro deslize (Vila do Conde) tudo começou a desmoronar-se muito depressa. O que se passou em Basileia é altamente desprestigiante para o Benfica. Tememos pelo que venha a acontecer com o United. A Champions está quase perdida e no campeonato estamos em risco de descolar dos da frente, sobretudo o Porto. Ao contrário do ano passado, este ano temos adversários competentes. Ao contrário do que aconteceu há duas épocas, este ano não temos a Champions para "compensar" um mau início no campeonato.
Este ano tudo está a correr mal, desde os resultados ao futebol praticado, à inconstância das escolhas de Rui Vitória em matéria de jogadores, às incertezas (e limitações) em termos de modelo de jogo. Rui Vitória parece mais desorientado e desanimado do que alguma vez o vi no Benfica.
O que mudou?
O que mudou é o sobretudo o que tenho assinalado em anteriores artigos: o plantel não apenas perdeu qualidade como envelheceu. Entrámos assim numa curva descendente que Vitória não tem sabido contrariar.
Pode Vitória inverter o presente estado de coisas?
A questão que se coloca aqui é se Rui Vitória chegou ao fim do seu ciclo, se esgotou a sua energia e as suas ideias. Um dos argumentos que ouço muito é o de que se acabou o "gás" que vinha ainda de JJ, que Rui Vitória não tem ideias próprias e que a memória dos "processos" (que vinha do anterior treinador) está a desaparecer.
Esta ideia é insólita. Quem a professa está a aderir por inteiro à lógica do "cérebro", aos argumentos do Ferrari e afins, que combatemos com tanta determinação há dois anos.
Será possível que se ache que uma equipa ganha dois anos em "piloto automático"? Que se preparem estratégias de jogos presentes a partir de esquemas e ideias do passado (que supostamente nem se domina)?
Defender isto é desrespeitar Rui Vitória, é ser injusto e não dar mérito a quem o tem. Vitória soube aproveitar o que tinha e tirar grande rendimento dos jogadores. Se assim não fosse os maiores clubes europeus não se teriam interessado pelos nossos jogadores e não teriam pago dezenas de milhões por eles.
Rui Vitória continua pois a ter as qualidades que tinha há dois anos. No entanto a verdade é que não está a conseguir colocá-las em prática da mesma forma. E a verdade também é que será sempre avaliado pelos resultados que produzir. Por isso a grande questão que se coloca é se Vitória irá conseguir inverter o estado de coisas.
O futebol do Benfica não agrada. Defensivamente a equipa é uma calamidade.
Luisão já não tem a meu ver condições para jogar a este nível. Certamente que esta dupla, com um Jardel muito debilitado relativamente há dois anos atrás, não funciona. Não se percebe porque saiu Rúben Dias da equipa. Estava a jogar bem e a compensar um pouco a falta de velocidade da nossa defesa. Há que ter a coragem de sentar Luisão ou Jardel. Depois Almeida tem muitas limitações. Há que trabalhar outras opções. O que se passa com Douglas?
No meio campo o Benfica não consegue ter controlo do jogo nem quando está a ganhar nem quando está a perder. Pizzi não pode jogar 90 minutos todos os jogos e, a manter o presente modelo, os extremos precisam de jogar de outra maneira.
São muitas questões para Vitória resolver mas é esse o seu papel. Acima de tudo o treinador precisa de ter energia, determinação e confiança nas suas capacidades e convicções. Só assim pode liderar estes jogadores e levá-los a inverter o rumo negativo da época. Apesar das limitações do plantel (e teremos necessariamente que ir ao mercado em janeiro) há qualidade para fazer muito melhor. Continua a haver jogadores de classe nesta equipa mas tem que se lhes dar um aproveitamento diferente. Há que procurar soluções que dêem outro equilíbrio à equipa.
Se e quando Rui Vitória deixar de ter a energia e a confiança necessárias para liderar a equipa, então será chegado o momento de dar o lugar a outro. Ainda não estamos lá. A pausa no campeonato é uma janela de oportunidade para o treinador retomar as rédeas e fazer a equipa entrar novamente nos eixos. Esperemos que a agarre.