quarta-feira, 5 de junho de 2013

O discurso da grandeza

O discurso acerca da grandeza do Benfica tem vindo a ser prejudicial aos nossos interesses.


São vários os valores constitutivos da história e da identidade do Benfica. A paixão e dedicação ao clube, o espírito de abnegação, a raça e o nunca desistir, a crença, o saber estar, a lealdade, o desportivismo, o respeito pelos adversários. Tudo isto faz parte da matriz do Benfica.


Mas a grandeza resulta dos resultados que, a par dessa forma de estar e dessa atitude moral, o Benfica obteve ao longo da sua história. Das suas conquistas e das suas vitórias.

Nos últimos anos, o Benfica não tem sido grande senão no número de adeptos - e repetir à exaustão essa discurso da grandeza não nos leva a parte nenhuma.

Porque razão o Benfica é Campeão Europeu de Hóquei?

Na minha perspectiva porque soube reconhecer que, não sendo a equipa mais forte da final four, teria que assumir uma postura humilde e saber jogar as suas armas. Na véspera da final, Luis Sénica disse que o Porto era o favorito. E BEM. Depois ganhou. Seria melhor ter dito que éramos nós os favoritos e depois perder? Para mim não.


A grandeza faz-se de títulos e os títulos conquistam-se usando da melhor forma as armas de que dispomos e fazendo das fraquezas forças.


Neste momento o Benfica tem que se colocar na posição de que não é o maior. Porque não o é de facto. 2 campeonatos em 11 para 9 do clube do Porto mostram-no, apesar de todos sabermos como as arbitragens têm tido um papel decisivo em muitos destes 11 anos.

Em vez de assumir uma postura de "grandeza", de que está "acima" do que se passa nos meandros do futebol e da arbitragem, na minha opinião o Benfica tem que assumir uma postura muito mais combativa. Tem que ter a lucidez e humildade de reconhecer que, bem ou mal (e a nosso ver mal, mas ainda assim esta é a realidade) o Porto é o "crónico" campeão. E, com essa postura combativa e humilde, começar a fazer tudo para quebrar esse domínio.

Há que desmistificar a postura portista de que vencem "contra tudo e todos", ainda agora repetida por dirigentes, técnicos e jogadores no fim do campeonato. Há que sublinhar a todo o momento que o que se passa é o contrário: o Porto tem tudo a seu favor. Não apenas tem a maioria esmagadora dos títulos dos últimos anos como ainda tem a constante protecção dos árbitros e das instâncias disciplinares, boa  imprensa (que nunca coloca questões incómodas ao Porto e está sempre pronta para elogiar a sua estrutura e organização) e até uma atitude passiva de vários adversários.

Na época que agora termina, o Benfica esteve calado em relação a tudo o que se passou, o que foi evidentemente muito prejudicial ao clube. Por exemplo: as declarações constantes do treinador do Porto contra jogadores do Benfica (Maxi, Enzo e Matic), alegando que tinham que ser amarelados; o que foi dito acerca do jogo com o Estoril e que foi INACREDITÁVEL. Não apenas na tentativa de espicaçar os jogadores do Estoril a fazerem o jogo das suas vidas como na tentativa de condicionar o trabalho do árbitro.

Entre outras coisas, foi dito, nas vésperas desse jogo entre Benfica e Estoril, o seguinte:


«Se me perguntasse há duas jornadas, eu diria que tinha legitimidade para ser um título bem discutido até à última jornada.»

«Neste momento, depois das duas últimas jornadas, já não acredito que assim seja. Não acredito que seja possível ao Estoril vencer na Luz. De uma forma ou de outra os três pontos vão lá ficar», 



«Acho impossível que isso (ndr. Estoril pontuar na Luz) aconteça. Podem escrever. Acho impossível.»

«Gostava que este campeonato fosse limpinho limpinho, mas para mim, na minha leitura, é um campeonato que fica manchado. Passa a sujinho, sujinho, sujinho, após o jogo inadmissível há duas jornadas.»



Mais do que mind games (que também são), estas declarações constituem uma forma de pressão e de condicionamento intolerável e que deviam ter merecido uma resposta imediata, expressando um total repúdio e exigindo uma investigação da Liga à possibilidade das mesmas configurarem uma infração dos regulamentos das competições, para além de de forma óbvia (isso não merece sequer discussão) atentarem contra a "honra" a a imparcialidade não apenas dos árbitros mas da competição. Recorda-se que Rui Gomes da Silva foi punido 10 ou 11 meses por esta razão.

Mas é esta atitude do Benfica de estar "acima" destas questões que o leva a silêncios que depois têm consequências altamente lesivas. É esta postura de "grandeza" que o leva a não abordar certos jogos da maneira mais correcta. 


E que leva a decisões erradas. Na realidade o Benfica até reagiu às provocações do Porto. Mas reagiu mal porque foi apresentar vídeos de jogos decorridos semanas ou meses antes quando tinha apenas que denunciar nos termos mais firmes e condenatórios declarações susceptíveis de colocar em causa a verdade desportiva. Até nas torpes insinuações feitas por Pereira a propósito de Jardel (que já desmistifiquei num comentário a outro post) e de Steven Vitória. Mais: as declarações de Vitor Pereira foram proferidas na véspera do jogo do Benfica com o Fenerbahçe, o que por si mesmo é infame e que deveria também ser denunciado e condenado. Ao invés de desejar boa sorte ao Benfica, como equipa portuguesa que estava às portas de uma final, o treinador do Porto viera lançar suspeitas sobre os nossos méritos e ainda desvalorizar o feito que estava à beira de ser realizado.

De uma atitude defensiva, o Benfica passaria a uma atitude de genuína e justificada indignação. Esta postura seria inatacável e defenderia os nossos interesses.


Esta mesma ideia errada de "grandeza" levou a que, nas vésperas do jogo com o Paços de Ferreira, quando aí sim se terão passado coisas estranhas, o Benfica voltasse a estar calado.

Para voltar a ganhar, é para mim evidente que o Benfica tem que desmontar o sistema que está montado e que permite ao Porto vencer quase por inércia. Para isso há que acabar com o discurso da "grandeza" e adoptar uma postura de defesa inteligente mas intransigente dos nossos interesses. É preciso sair da zona de conforto e adoptar uma postura combativa e destemida.

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